Topo

Série ‘Cordas Brasileiras’: o cavaquinho – tradição e possibilidades

Série ‘Cordas Brasileiras’: o cavaquinho – tradição e possibilidades

Por Fernando Duarte

Quando o cavaquinho se tornou popular no Brasil? E para as novas tendências musicais, quais são as possibilidades que ele oferece? As respostas para essas perguntas podem ser encontradas no novo artigo de Fernando Duarte para a série ‘Cordas Brasileiras’! Desta vez, sobre um instrumento consolidado como um dos mais característicos da música brasileira.

 

Quer conhecer mais sobre ele e sobre nossa música? Então, boa leitura!

 

Em sua viagem pelo Brasil no início do século XIX, o pintor francês Jean-Baptiste Debret descreveu: “É certo que no Brasil a cabana e o palácio são o berço comum da música. Por isso ouve-se dia e noite o som da marimba do escravo africano, do violão ou do cavaquinho do homem do povo, e a harmonia mais sabida do piano do homem rico.”

Companheiro do violão nas rodas de música do povo, o cavaco, ou cavaquinho, espalhou-se pelo mundo pelas mãos dos colonizadores portugueses. Com nomes diversos como machete, machetinho, machete de braga, braga ou braguinha, o instrumento está presente na Europa, Américas e mesmo na Ásia. Até o famoso ukulele havaiano descende do cavaco português!

Diversos modelos portugueses de cavaquinho (fonte: juliopereira.pt)

No Brasil, o cavaquinho está presente na primeira formação instrumental do choro, compondo o chamado “trio ideal” ao lado do violão e da flauta. Abaixo, podemos ouvir a valsa Saudade Eterna, de 1915, executada por esses instrumentos.

 

O cavaquinista e compositor Waldir Azevedo

 

O cavaquinho está ligado ao samba desde seus primeiros dias nas festas nas casas das “tias” baianas no Rio de Janeiro do início do século XX, sendo obrigatório em qualquer manifestação do samba tradicional, pagode, partido-alto e nas escolas de samba. Em muitas manifestações é o único instrumento de harmonia entre diversos de percussão. Através do samba o cavaquinho marcou sua presença como um dos instrumentos mais característicos da música brasileira.

Em 1949, o cavaquinho explodiu em popularidade com o lançamento em disco de Brasileirinho e Carioquinha, de Waldir Azevedo. A técnica apurada do cavaquinista e a comunicação simples de suas composições transformaram Waldir em um sucesso de vendas e alvo de uma popularidade inédita para um instrumentista no Brasil. A fama chegaria ao auge com Delicado, baião que se tornou um fenômeno internacional, e que podemos ver e ouvir abaixo, interpretado pelo próprio compositor, junto de uma orquestra.

 

Embora consagrado no samba e no choro, o cavaco parecia um instrumento ultrapassado para o público jovem dos anos 60 e 70, influenciado pela Bossa Nova, Jovem Guarda e Tropicália. O pós-tropicalismo hippie dos Novos Baianos renovou o interesse pelo cavaco, entre outros elementos da música brasileira mais tradicional. O segundo álbum do grupo, Acabou Chorare (1972), mistura Waldir Azevedo, Jimi Hendrix e João Gilberto num momento em que as decisões estéticas sofriam forte policiamento ideológico e se transformou em um clássico, ainda hoje liderando as listas de discos mais importantes da música brasileira. Veja ao lado o grupo interpretando Brasil Pandeiro, de Assis Valente (note o uso que é feito do cavaco).

Consolidado no samba, choro e muitas outras manifestações da nossa música tradicional, o cavaquinho chega a nossos dias se infiltrando em fusões com a música pop, rock ou se aproximando da música de câmera. O seu uso mais frequente, como instrumento de acompanhamento, é ampliado por novas técnicas de solo ou pela utilização de efeitos eletrônicos. Como exemplo das amplas possibilidades do cavaquinho, ficamos com Mundo Livre S/A e Pedro Cantalice.

 

No próximo encontro vamos falar do bandolim, instrumento com uma longa história na música erudita, mas que criou uma identidade bem brasileira!

Fernando Duarte

Bandolinista e compositor, mestre em Práticas Interpretativas na UFRJ, licenciado em Música pela UFES, bacharel em Comunicação Social pela mesma instituição e formado em Música Popular na FAMES, Fernando é autor de alguns livros sobre choro e bandolim.

Sem comentários

Deixe seu comentário